domingo, 25 de agosto de 2013

GOLGONA ANGHEL [10.369]


Golgona Anghel 

Nació en Rumania y llegó a Lisboa, donde vive ahora, para estudiar Inglés y literatura contemporánea. Ha adquirido desde entonces un doctorado en este tema y es una profesora universitaria.

Libros de poesía desde 2000: 

Crematorio sentimental (2007), Como desaparecen (traducción de José Ángel Cilleruelo) (2011), He venido porque he pagado (2011), Lobos (con David Telles Pereira y Diogo Vaz Pinto) (2013).



AHORA QUE YA NADA IMPORTA

Ahora que  ya nada importa
alegramos las tardes de domingo
con un montado de lomo en las casetas antes del partido
algunos cotilleos frescos, discusiones sobre Sartre,
el post-estructuralismo y esa broma
que hace que cualquier marxista paleto
parezca inteligente  al lado de un anarquista.
El único interés que aún tenemos realmente en común
es compartir el alquiler
y una botella de vino.
A veces, aún recibimos alguna invitación
mira, no es fácil, con el niño y eso
Al final siempre terminamos por quedarnos en casa

El desinterés se acumula a mi alrededor
como las capas seculares
en el tronco de una sequoia.
Ya soy inmune a los lloriqueos
Lavo solo mi propia ropa.
Mi lengua empieza a tener una espesura leñosa
En el lugar del grito
una grieta,
Manos en los bolsillos.
Boca cerrada.
Evito escaparates y espejos
tengo miedo a que la verdad
me pueda desfigurar el rostro .

Como uma flor de plástico na montra de um talho (Assírio & Alvim, 2013)
Traducción/Revisión: Montserrat Villar González y J.G



AGORA QUE NADA MAIS IMPORTA

Agora que nada mais importa,
consolamos as tarde de Domingo
com bifanas das tasquinhas montadas antes do jogo,
alguns boatos frescos, discussões sobre Satre,
o pós-estruturalismo e essa piada
que qualquer outro marxista parolo
parece esperto ao pé de um anarquista.
O único interesse que ainda temos realmente em comum
é dividir o aluguer
e uma garrafa de tinto.
Ás vezes, ainda recebemos algum convite,
e olha, não é fácil, com o miúdo e tal.
Mas acabamos por ficar em casa.

O desinteresse acumula-se à minha volta
como as camadas seculares
no tronco de um sequoia.
Fico imune as quiexinhas.
Lavo sozinho a minha roupa.
A minha língua está a ganhar uma espessura lenhosa.
No lugar do grito,
uma greta.
Mãos nos bolsos,
bico calado.
Evito vitrinas e espelhos.
Tenho medo que a verdade
me possa desfigurar o rosto.

Como uma flor de plástico na montra de um talho (Assírio & Alvim, 2013)



NADIE RECHAZA UNA BOCA RICA

Nadie rechaza una boca rica,
ni siquiera cuando ataca, de cerca,
con aquella energía de niñato engreído
que tomó más coca-colas de las que debía.
No está todo perdido:
La lluvia ordena el tiempo en las goteras.
De aquí a cuatro años me gradúo
en copas vacías,
ojeras
y sillas mojadas.
El cielo se abrirá
como unos pantalones cortos
en un parking.

Como uma flor de plástico na montra de um talho (Assírio & Alvim, 2013)
Traducción/Revisión: Montserrat Villar González y J.G



NINGUÉM RECUSA UMA BOCA RICA

Ninguém recusa uma boca rica,
nem mesmo quando ataca, de perto,
com aquela pedalada de puto esperto
que bebeu mais coca-cola do que devia.
Não está tudo perdido:
a chuva alinha o tempo nas goteiras.
Daqui a quatro anos vou ser formada
em copos vazios,
olheiras
e cadeiras molhadas.
O céu abrir-se-á
como um par de calções
num parque de estacionamento.

Como uma flor de plástico na montra de um talho (Assírio & Alvim, 2013)



MIRE, NECESITO DINERO

Mire, necesito dinero.
Necesito mucho dinero. Quiero abrir un negocio.
Algo mío, lo entiende. Estoy harto de jefes.
No puedo pasar la vida detrás de una barra.
Aguantando todas las noches con la baba de los perdidos en la cara.
Ya no tengo paciencia
Con esta edad, ya ve lo que es.
Aguantando a todos esos cerdos
Ya probé en otros bancos, sí.
Pedí también a mis padres, es verdad;
les dije que era para casarme.
No, no tengo casa, ni coche.
Pero, mire, puedo garantizarlo con mi cuerpo
Mi hígado, señor, tiene que ver mi hígado.
Es un hígado de motero. Parece encogido y eso,
pero va a mil.
Y por adelantado , no puede pagar nada como adelanto?
Por adelantado ,no lo sé.
Solo si fuera el corazón.

Como uma flor de plástico na montra de um talho (Assírio & Alvim, 2013)
Traducción/Revisión: Montserrat Villar González y J.G



OLHE, PRECISO DE DINHEIRO

Olhe, preciso de dinheiro.
Preciso de muito dinheiro. Quero abrir um negócio.
Algo meu, sabe como é. Estou farto de patrões.
Não posso passar a minha vida atrás de um balcão.
A levar todas as noites com a baba dos perdidos nas trombas.
Já não tenho paciência.
Com esta idade, já viu o que é.
Sujeitar-se a todos os labregos.
Já tente noutros bancos, sim.
Pedi também aos meus pais, é verdade;
disse-lhes que era para me casar.
Não, não tenho casa, nem automóvel.
Mas, olhe , posso garantir com o meu corpo.
O meu fígado, senhor, tem que ver o meu fígado.
É fígado de motard. Isto parece encolhido e tal,
mas anda a mil.
E adiantado, não pode pagar nada como entrada?
Entrada, não sei.
Só se for o coração



No me interesa lo que
dicen los disidentes de la dictadura.
Pero confieso que me gustaban los chocolates Toblerone
que mi tía me traía en Navidad.

No creo en los presos políticos,
ni me impresionan los niños descalzos
que les muestran los dientes a las máquinas Minolta
de los turistas italianos.

No voy a pedir asilo.
Desconozco los avances
o retrocesos económicos de mi país.
Ya he hablado de Drácula lo bastante.
Ya recogí fresas en Andalucía.
Ya he sido gitana, ya he sido puta.
No necesitan volver a preguntármelo.

Lo que me preocupa —y, eso, sí puede ser relevante
para el fin de la historia— es saber
cuándo fue que me transformé,
yo que era una loba solitaria,
en este caniche de departamento que les habla ahora.

Traducido por Aníbal Cristobo 



Não me interessa o que
dizem os dissidentes da ditadura.
Mas confesso que gostava dos chocolates Toblerone
que a minha tia me trazia no Natal.
Não acredito nos detidos políticos,
nem me impressionam os miúdos descalços
que mostram os dentes para as máquinas Minolta
dos turistas italianos.
Não vou pedir asilo.
Desconheço os avanços
ou retrocessos económicos do meu país.
Já falei de Drácula que chegue.
Já apanhei morangos na Andaluzia.
Já fui cigana, já fui puta.
Escusam de mo perguntar outra vez.
O que me preocupa – e isso, sim, pode ser relevante
para o fim da história – é saber
quando é que me transformei,
eu que era uma loba solitária,
neste caniche de apartamento que vos fala agora?




NO ME GUSTA CONTAR LOS DESASTRES EN DETALLE... 

No me gusta contar los desastres en detalle
pero, si quieren, puedo escribir una lista con nombres y camas.

Soy muy capaz de mojarme el pie en la historia de la barbarie,
condecorar al miedo,
cortarme la mano con la que limpio las heridas
de una civilización que cae.

Puedo perfectamente
ir afilando el borde de la esperanza
con la flor blanca de un cancro.

Soy, en definitiva, este comediante callejero
que le sirve a los desconocidos,
en vasos pequeños,
la medida cierta de su agonía.
Descubre sueños
donde otros sólo encuentran conejos.
Hoy, por ejemplo, al quitarse los guantes,
vio que le faltaban dedos. 

Traducido por Aníbal Cristobo 



[I DON’T LIKE TO RECOUNT DISASTERS IN DETAIL]

I don’t like to recount disasters in detail
but, by request, I can write a list of names and beds.
I'm well able to indulge in barbaric history,
decorate fear,
cut my hand, which I use to clean
the wounds of a declining civilisation.
I can perfectly
keep sharpening hope’s blade
on the white flower of a cancer.
I definitely am that street comedian
who serves in small cups,
to strangers,
the right measure of their agony.
She discovers dreams
where others can only find rabbits.
For instance, today, as she took off her gloves,
she noticed she was lacking in fingers.

© Translated by Ana Hudson, 2012



[NÃO GOSTO DE CONTAR OS DESASTRES EM DETALHE]

Não gosto de contar os desastres em detalhe
mas, se quiserem, posso escrever uma lista com nomes e camas.
Sou bem capaz de molhar o pezinho na história da barbárie,
condecorar o medo,
cortar-me a mão com que limpo as feridas
de uma civilização em queda.
Posso perfeitamente
ir afiando o gume da esperança
com a flor branca de um cancro.
Sou, em definitivo, este comediante de rua
que serve a desconhecidos,
em copos pequenos,
a medida certa da sua agonia.
Descobre sonhos
onde outros só encontram coelhos.
Hoje, por exemplo, quando tirou as luvas,
viu que lhe faltavam dedos.

in Vim porque me pagavam, 2011




In insomnia’s reading room

In insomnia’s reading room,
when the rubbish truck is
the only answer to silence
and each instant is a lover
we kill in an opening and closing of legs,
I follow as an echo, down to the station,
the hurried step of the cleaning ladies.
For them, there’s no hell.  They just
avoid dreaming.
For us, the 837 bus destination will always be Calvary,
even if I pay for my ticket.
In the slow but sure horizon of an utopia-light,
I spend my days selling my third world
in international conferences and talks.
I show everybody my golden canine tooth,
my giraffe skin,
the bibliography in French.
I write the word empty
after the word waiting.
I lay my hands on my tired knees.
Clean
but badly dressed,
 – look –
I’m the new model for failure.




Na sala de leitura da insónia

Na sala de leitura da insónia, 
quando o carro do lixo é 
a única resposta ao silêncio
e cada instante é um amante
que matamos num abrir e fechar de pernas,
acompanho em eco, até à estação,
os passos apressados das empregadas de limpeza.
Para elas, não há inferno. Simplesmente, 
evitam sonhar.
Para nós, o autocarro 738 irá sempre ao Calvário, 
mesmo se pago o bilhete. 
No horizonte lento mas seguro de uma utopia light,
passo o dia a vender o meu terceiro mundo
em colóquios e palestras internacionais.
Mostro a toda a gente o canino de ouro, 
a minha pele de girafa,
a bibliografia em francês.
Escrevo a palavra vazio 
depois da palavra espera.
Pouso as mãos sobre os joelhos cansados.
Limpa 
mas mal vestida,
- olhai –
sou o novo modelo para o fracasso. 

© Translated by Ana Hudson, 2011
in Vim porque me pagavam, 2011


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